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MUNDO BOTONISTA

Por Sergio Travassos (17/09/2025)

Compromisso

Mais uma madrugada insone. Sozinho e solitário, observo o abajur de luz amarela a iluminar o quarto escuro. Lá fora, a chuva intensifica-se e o cair das gotas no telhado e nos vidros das janelas deveriam acalmar-me. Porém, o que ocorre é, justamente, o contrário. Sinapses explodem em velocidade. Tudo o que é pensamento do que passou e do que nem sei, passa a milhão na minha cabeça. 

Vexado (expressão nordestina para acelerado) sigo em pensamentos. Tento alguns exercícios para esvaziar a mente. Mas sinto-me feito Atlas a carregar um mundo. Após umas duas horas, decido levantar-me e acender as lâmpadas. No clima frio — deve estar uns 18° —, sento-me e começo a teclar essas palavras. Geralmente, amo passar a madrugada silenciosa a pensar, ler, escrever, mas essa, não. Deve ser porque preciso estar acordado e pronto para sair às quatro horas e trinta minutos.

Lembro-me do meu compromisso. Aliás, muitos compromissos. O que menos cumpro, são os comigo mesmo. Por pensar em compromisso e esse ser um espaço para o futebol de mesa, vou escrever sobre tal. Colocamo-nos muitos compromissos. Alguns, feito amarras pesadas. Viram cobranças insanas. Preciso treinar mais. Preciso prestar a atenção nisso ou naquilo. Preciso estudar o jogo melhor. Melhorar a visão. Ficar atento aos desvios do campo. Compromisso. Cobrança. Sempre no eu. No ego. Egoísta.

Tudo pequeno quando você expande o pensamento. Quando você pensa nos sonhos iniciais dos criadores do jogo: divertir. Ludicidade. Depois, veio a formalização do jogo, unificação de regras. A tentativa de criar um desporto capaz de trazer emoção e raciocínio de forma equilibrada. No primeiro ponto, os pioneiros criadores conseguiram, até certo ponto, alcançar êxito. No segundo, até que conseguiram criar um desporto realmente rico. Ambos trabalharam com afinco. Contribuíram substancialmente para a nossa regra 1 Toque.

No entanto, não enxergo na maioria, o compromisso de buscar entender o jogo como um desporto. Nada contra. Ao menos até a segunda página, como diz certo ditado popular. Ao meu ver, deve-se, sim, pensar no todo antes de pensar em si. O todo, há uma década venho repetindo aos ouvidos que escutam, tem urgências. 

Ouço muitos a reclamar da renovação insípida. Poucas ações reais nesse caminho. Talvez, para chamar a atenção, precisemos ter o compromisso de pensar drasticamente. Pensar que o nosso jogo está em extinção. Parece um exagero, visto que temos um grande contingente de botonistas que jogam as competições pelo Brasil. Podemos bater no peito e dizer que somos a regra com o maior número de praticantes. Opa, que ótimo. É esse pensamento que faz tudo desmoronar. Em contraponto, penso que devemos pensar na extinção desse fascinante e inteligente jogo. Sim. Esse jogo que nos fascina está em vias de ser extinto. 

Obviamente, não sou dramático. Ao menos, não mais do que qualquer latino. Contudo, acredito que, só com esse pensamento na cabeça, poderemos ter um momento de urgência e empatia com os que poderiam se encantar com esse jogo no futuro. É quase como pensar que as gerações futuras não desfrutarão de um clima ameno, andar num jardim cheio de vida e cores. 

Penso que, talvez, se todos nós pensarmos assim, poderemos ter o compromisso de sermos vexados em prol do nosso amado desporto. Um desporto que é justo, pois a cada jogada do adversário, você tem o poder de defender-se no momento seguinte. Um jogo inteligente pois, tal qual o xadrez, temos que antever os próximos movimentos nossos e os dos adversários – e modificar a estratégia a cada uma das jogadas, gerando uma complexidade desgastante de pensamentos. Onde, apesar de cartesiano, é demasiado humano. E, sendo humano, é criação, transpiração e inspiração. Aonde o gol é belo. A travada é comemorada. O tapinha é um alívio maravilhoso.

Ingenuamente, acredito que podemos mudar o destino. Para tal, precisamos de um senso de urgência. E também de união – muita. Antecipar-mo-nos em direção de um entendimento para lutar. É possível também, inspirar-mo-nos em outros desortos que resistiram e abraçaram o compromisso de pensar algo para evitar a sua extinção e que conseguiram uma reversão. Cito aqui o xadrez que vive a mesma luta de enfrentar a modernidade, a velocidade do dia-a-dia, a crença de que as crianças e jovens não querem mais – ledo engano. Gostaria que você que lê esse artigo, abrace o compromisso de urgência e lute com todas as suas forças para crer que há uma criança, um jovem, um adulto, que precisa conhecer o nosso jogo. Vá aonde essas pessoas estão. Saiba que não estará só, pois há gente com esse compromisso, de Norte a Sul. 

Sei que lutar cansa. Principalmente para você que já luta tantas batalhas. É possível, no entanto, que essa luta pelo nosso desporto, venha a ser o combustível para que você também enfrente melhor os seus próprios desafios. Compromisso é o caminho diante da urgência. 

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Sergio Travassos é diretor do Santa Cruz F.C. há doze anos, jornalista com outras duas formações, Educação Física e Marketing, que atua há muito tempo em prol do desporto pernambucano. Tendo passagens pela Federação Pernambucana e CBFM. Sendo uma das figuras que mais defende o jogo de futebol de mesa, independente da regra de atuação, bem como que as competições sejam feitas em locais públicos, visando atrair mais visibilidade para o futmesa.

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travassos@mundobotonista.com.br
(081) 97100-2825

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