Painel do Mundo
Por José Carlos Cavalheiro (14/07/2023)
O futebol de mesa é essencialmente amador e, como a maioria dos esportes dessa categoria, enfrenta problemas similares como a carência de lideranças, a falta de relevância social, a escassa compreensão legal por parte dos seus dirigentes e uma estrutura organizacional bastante deficiente. Igualmente às outras atividades desportivas não profissionais, falta deixar claro aonde se quer chegar e quais os instrumentos que devem ser utilizados para se alcançar o objetivo, quando ele for definido. Entretanto, o futebol de mesa apresenta desafios bastante específicos e é sobre eles que eu gostaria de me aprofundar nessa coluna.
Estamos nos encaminhando para quatro décadas do nosso reconhecimento como esporte. Contudo, o futmesa ainda não é percebido como tal pela maioria da população brasileira. O motivo para tanto, no meu entender, é óbvio e se trata da associação com o jogo infantil, o que faz com que nosso esporte, para muitos leigos, não seja considerado uma atividade séria. A associação com o brinquedo lança, muitas vezes, sobre nós um olhar jocoso. Sermos levados a sério é o primeiro obstáculo que devemos enfrentar.
Um dos desafios mais sérios é a própria sobrevivência do futmesa. Em um mundo que se transforma rapidamente e fica a cada dia mais tecnológico, as atividades analógicas vêm sendo substituídas pelas digitais. A nossa simulação analógica do futebol, o brinquedo jogo de botão, praticamente desapareceu do comércio nos anos 90 do século passado e, com ele, a renovação, imprescindível para qualquer esporte, ficou altamente comprometida. Chegamos nesse ponto a uma contradição, pois a associação com o brinquedo prejudica a nossa imagem, mas sem ele não teremos novos praticantes, dos quais necessitamos com urgência. A idade média dos nossos atletas é alta e, infelizmente, não enganaremos a morte. Sendo assim, é necessário pensar muito seriamente em quem nos vai substituir.
Como lidar com a grande diversidade de regras é outro ponto que devemos ter em conta. Temos aqui uma outra contradição, pois as diferentes formas de praticar o futmesa são a expressão de como o jogo se desenvolveu nas diferentes regiões brasileiras, além de em outros países. Assim, pode-se escolher a regra que melhor se enquadra no temperamento e na cultura de cada um o que, certamente, aumenta o número de praticantes.
Temos, oficializadas, as modalidades 1 Toque, 3 Toques, 12 Toques, Chapas, Dadinho, Sectorball e Subbuteo. E ainda temos regras regionais como a Gaúcha, Maranhense, Paraibana, Pernambucana e a Pastilha, originária do Rio de Janeiro, mas que já chegou ao Ceará, sem falar na regra Catalã, que alguns querem implantar no Brasil. Tanta variedade, apesar de ser democrática e abrangente, gera confusão para os leigos e cria uma dificuldade de entendimento do que realmente é o esporte.
Ademais, se quisermos uma internacionalização para valer, qual dessas modalidades deveria ser a escolhida? Na improvável hipótese de nos candidatarmos a esporte olímpico, a internacionalização é uma exigência fundamental, pois o esporte candidato deve ser praticado na maioria dos países do mundo. São considerados também alguns outros fatores como a atratividade do esporte para os veículos de comunicação, apelo da juventude, igualdade de gênero e o esporte precisa ser regido por uma Federação Internacional.
Apenas esses poucos exemplos mostram que ainda engatinhamos como esporte e nossa hipotética candidatura seria inviável. A 12 Toques tem esse status de modalidade internacional brasileira, entretanto, no meu entender, o Subbuteo é a modalidade que largaria na frente, e com muitos corpos de vantagem, por ser, verdadeiramente, globalizada. Seria muito melhor que houvesse apenas uma regra, mas como isso é impossível na nossa realidade, um foco mais contundente sobre a modalidade escolhida para a internacionalização seria uma boa estratégia a ser usada.
A inclusão feminina no futmesa é outro a fator a ser considerado com muito carinho. A participação das meninas, apesar de vir crescendo, ainda é ínfima. Temos e tivemos mulheres participando ativamente no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. E seria interessante definir se elas jogariam misturadas com os demais atletas, da mesma maneira que no iatismo e na equitação, visto que no futmesa não é um esporte onde a força física seja um fator de vantagem, ou em categoria própria onde elas, certamente, se sentiriam mais à vontade. Com a chegada massiva do sexo feminino ao nosso meio teríamos que controlar a masculinidade tóxica de alguns dos nossos esportistas.
Outro grande desafio do futebol de mesa é levá-lo ao conhecimento de quem não o pratica. Com o advento das redes sociais essa tarefa poderia parecer fácil. Entretanto, o público que acompanha nossas atividades é, basicamente, formado pelos próprios praticantes do esporte. Mesmo a associação do futmesa com clubes de futebol de grande torcida, que existe em estados como Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, não nos deu a visibilidade esperada. Uma estrutura de divulgação capitaneada por profissionais de marketing é, no meu entender, fundamental para que o futebol de mesa expanda seus horizontes.
Talvez, com essa verdadeira divulgação, possamos ser levados mais a sério e se tenha a tão esperada renovação.
Entretanto, uma campanha de marketing custa muito caro e aí chegamos a mais um grande desafio do esporte, e de todos nós, que é a capitalização. Mesmo sendo amador, o futmesa necessita de recursos, sejam eles oriundos do setor privado ou público. Além se patrocinar a divulgação, se poderia renovar o material de jogo, se investir em instalações e, principalmente, tornar a nossa estrutura administrativa mais eficiente. Atualmente, a administração do nosso esporte é gerida por voluntários que, apesar de toda a boa vontade e dedicação, necessitam dar prioridade aos seus assuntos pessoais, de forma que as atividades de apoio ligadas ao esporte fiquem relegadas a um segundo plano.
No meu entender, esses são alguns dos desafios que o futebol de mesa brasileiro deve seriamente enfrentar e essa é uma tarefa de todos: atletas, clubes, federações e confederação. Dedicar-se ao futmesa vai muito além de colocar o time na mesa. Muitos já estão arregaçando as mangas e merecem todos os nossos elogios. O importante é que todo esse esforço, que já existe, seja feito de maneira pensada e coordenada para que o futmesa continue existindo e cresça nos próximos quarenta anos.
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Formado em Agronomia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, José Carlos Marques Cavalheiro, nasceu na capital carioca no ano de 1962. Foi atleta de futebol de mesa na modalidade Bola 12 Toques de 1998 a 2005, quando foi viver em diferentes lugares: São Paulo, Paris, Jundiaí e Bogotá, onde atualmente reside. É o responsável pelo site da FEFUMERJ desde dezembro de 2004. Atualmente exerce o cargo de Diretor de Comunicação da entidade.
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