Painel do Mundo
Por José Carlos Cavalheiro (03/12/2023)
O Rio de Janeiro continua sendo...
Há dois anos não regressava ao Brasil para permanecer por um tempo mais prolongado. Estivera no Rio de Janeiro em outubro de 2022 para receber meu primeiro benefício como aposentado, ato obrigatoriamente presencial. Desta vez, vim com o intuito de permanecer exatas quatro semanas e resolver problemas de ordem pessoal, o que não poderia fazer desde longe. Os cinco dias daquela estadia relâmpago não foram suficientes para sentir toda a energia que emana, para o bem e para o mal, de um lugar tão especial como o Rio de Janeiro. Não só a cidade é diferente, como também o é o carioca, um ser que no meu entender, merece um estudo sociológico profundo que explique essa mescla de cordialidade, alegria e de uma informalidade exagerada que, muitas vezes, roça os limites do que muito consideram ser a correta etiqueta social.
Quem retorna a sua terra natal o faz com lembranças, expectativas e alguns preconceitos. Ninguém que vive muito tempo longe do lugar onde nasceu e cresceu – no meu caso há 18 anos – está imune às diferentes culturas as quais foi exposto. Existe uma música de um grupo chileno chamado Inti Ilimani que fala sobre essa salada de sentimentos que assola quem regressa. Para os interessados o nome da canção é Vuelvo (volto ou regresso em tradução livre). O retorno faz com que o ausente tome consciência das contradições e complexidades da sua terra natal e o Rio de Janeiro, talvez mais do que qualquer outra cidade brasileira, está cheio delas.
Nos dias em que estive livre para atividades mais prazerosas do que resolver problemas, pude me dar conta da intensidade com que se está vivendo o futebol de mesa na cidade. A Grande Tijuca, região da Zona Norte carioca, que engloba os bairros da Tijuca, Visa Isabel, Andaraí, Grajaú e Maracanã, é o centro nervoso do jogo na cidade. Por ter uma residência na região, pude me deslocar facilmente, quero dizer caminhando, para vários eventos. O Campeonato Brasileiro Interclubes da modalidade Dadinho foi realizado há 15 minutos do meu apartamento. No Boulevard Shopping, situado a igual tempo de caminhada, há uma loja especializada em artigos de futebol de mesa e que conta com oito mesas disponíveis para a disputa de amistosos e torneios. Devido à proximidade fui lá diversas vezes para conversar com o dono, que é uma pessoa muito agradável. Também fui caminhando para a Associação Atlética Light onde aconteceu uma reunião da Diretoria Geral da Federação de Futebol de Mesa do Estado do Rio de Janeiro (Fefumerj) na qual sou o responsável pela pasta da Comunicação.
Contudo, a paixão pelo futebol de mesa está presente em outras partes da cidade. Um amigo me levou a uma pequena sala, em uma das ruas mais tradicionais do Centro do Rio de Janeiro onde há uma oficina de reparo de computadores, com suas telas, discos rígidos, discos SSD, memórias RAM, laptops que convivem em harmonia com um torno, uma impressora laser, placas de acrílico, de acetato, lixas d´água, times de botão prontos e por acabar. O dono ainda oferece cerveja para quem faz times com ele. Como disse anteriormente, o carioca é diferente.
Esse mesmo amigo tem uma pequena barraca em uma feira que acontece todos os sábados na Rua do Lavradio. Lá ele vende os botões que também fabrica e revende outros que comprou. Também disponibiliza uma minúscula mesa para a realização de partida no melhor estilo leva-leva. Quando estava jogando com ele (obviamente venci) pude ver o brilho no olhar das pessoas quando se davam conta que se tratava do futebol de botão. Não muito distante, nos Arcos da Lapa, em um bar chamado Casa de Luiza, se reúne a Comuna Bolchevique de Futebol de Botão. Infelizmente não pude ir visitá-los. No mesmo centro antigo tive a oportunidade de conhecer o CT do Botafogo, localizado na Rua do Riachuelo. Um espaço imenso que recebe competições oficiais e não oficiais do esporte, em suas diferentes modalidades. Neste lugar fui presenteado com uma camisa da Associação Atlética Portuguesa, a Lusinha Carioca.
Na Zona Sul, parte mais nobre da cidade, o futebol de mesa também ferve. Participei do I Open Flu da modalidade Pastilha, na sede do tradicional clube tricolor. Não muito longe dali, em um belo sábado ensolarado do inverno carioca, presenciei duas Ligas jogando ao ar livre a modalidade dadinho no mesmo horário, separadas por menos de 50 metros de distância. Também fui jogar minha regra preferida, a Bola 12 Toques, no Flamengo, outro clube da Zonal Sul, talvez o melhor ambiente que já frequentei na modalidade.
Obviamente não consegui percorrer toda a cena do futebol de mesa carioca. Há muita atividade em clubes tradicionais como o Vasco da Gama, America, Olaria, São Cristovão, Bangu, Portuguesa, River, Piedade, como também uma infinidade de Ligas que não estão federadas e uma grande quantidade de artesãos. O futebol de mesa pulsa com intensidade na cidade onde nasci e vivi os primeiros 43 anos da minha vida. A locomotiva do esporte em terras cariocas é a modalidade Dadinho, mas há espaço para todas e também para o jogo informal. Inclusive, durante minha estadia, foi realizado o Campeonato Brasileiro da Modalidade Chapas na Zona Oeste da cidade.
Ao caminhar pelos bairros e pelas ruas da capital fluminense, ao embrenhar por este mar de cores, acrílicos e fantasia, um aficionado pelo mundo do futebol de mesa tem a impressão de estar circulando na "Botolândia" - algo equivalente à "Terra dos Botões", se me permitem a analogia. Vendo tamanha diversidade, com tanta força e profusão, me arrisco a dizer (com baixa margem de erro) que o Rio de Janeiro é a capital brasileira, quiçá mundial, do futebol de mesa.
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Formado em Agronomia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, José Carlos Marques Cavalheiro, nasceu na capital carioca no ano de 1962. Foi atleta de futebol de mesa na modalidade Bola 12 Toques de 1998 a 2005, quando foi viver em diferentes lugares: São Paulo, Paris, Jundiaí e Bogotá, onde atualmente reside. É o responsável pelo site da FEFUMERJ desde dezembro de 2004. Atualmente exerce o cargo de Diretor de Comunicação da entidade.
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