Painel do Mundo
Por Sergio Travassos (05/07/2022)
Madrugada insone. John Lee Hooker abranda os batimentos cardíacos no fone de ouvido. Temperatura amena para a madrugada recifense. Algo passa na TV e eu nem desperto interesse em atenção. Na minha mente, apenas três palavras aparecem no escuro, em letras neon: dedicação, abnegação e abdicação. Tal qual a poesia de Fernando Pessoa:
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
Já explico essa viagem. Antes, no entanto, sabemos que para tornar-se um dos grandes do fumesa, principalmente nessa nossa modalidade, temos que ter dedicação (mesmo aqueles mais talentosos). E dedicação nada mais é do que entregar-se o máximo possível para controlar os nervos, melhorar passes, travadas, arremates e as tomadas de decisão. Admiramos e elogiamos bastante isso nos campeões.
O que muitos se esquecem é que a cada passo em direção à dedicação, sacrifica-se algo. É onde entra outro substantivo, a abdicação. Todo campeão digno renunciou algo: cerveja, família, descanso. Há muita convicção em quem abdica tanto por um objetivo.
Essas duas virtudes, dedicação e abdicação, andam juntas e são proporcionalmente crescentes. Isso forma um campeão, sim. Porém, existem campeões que levantam taças, copam geral. E há os campeões que vão além disso. São inteiro: são nada.
E o que é ser nada, afinal? É esquecer-se de si e pensar além. É entender que cada amistoso, tempo com novatos, apresentação do jogo para crianças, ouvir os velhos botonistas, contribuir de alguma forma com o seu colega ou clube é mais importante. E o é, pois o todo, quase sempre, é mais importante do que as nossas vontades. Ou deveria sê-lo.
Às vezes, é ir além do que o peso dos troféus os deixa ir. É ser campeão sem taça, sem estar no topo, sem louros ou tapinhas nas costas. É abnegar-se. Que bom seria se todos pudessem abnegar-se mais vezes dentro de sua comunidade. Não é fácil e cansa bastante, mas é a forja perfeita para, tal qual a Lua da poesia de Pessoa, se elevar para brilhar mais. O desporto agradece.
Sergio Travassos é diretor do Santa Cruz F.C. há doze anos, jornalista com outras duas formações, Educação Física e Marketing, que atua há muito tempo em prol do desporto pernambucano. Tendo passagens pela Federação Pernambucana e CBFM. Sendo uma das figuras que mais defende o jogo de futebol de mesa, independente da regra de atuação, bem como que as competições sejam feitas em locais públicos, visando atrair mais visibilidade para o futmesa.
....................................
travassos@mundobotonista.com.br
(081) 97100-2825