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MUNDO BOTONISTA

Por Giovanni Nobile (17/10/2021)

Sua palheta joga por música?

"Não lembramos de muitas coisas que estão em nossa memória, e o que recordamos nem sempre é um retrato exato dos fatos (...) os fatos que esquecemos não desaparecem: vão para debaixo da memória e podem voltar a qualquer momento, sem avisar, muitas vezes disfarçados, incompreendidos."


Essas palavras são de Tostão, no livro “Tempos vividos, sonhados e perdidos: um olhar sobre o futebol”, pela Companhia das Letras. A partir dessa leitura, fui vasculhar um pouco sobre essas memórias que estavam perdidas. Encontrei, na lembrança de décadas atrás, duas metades de palheta remendadas com fita crepe amarela. Antes de se quebrar, ela chutava como ninguém. O acidente foi um pisão que doeu mais no peito do menino de oito anos – que tinha a total confiança em seu ataque – do que na sola de seu pé descalço e distraído. Ela ficou um tempo no departamento médico, enquanto diversos substitutos tentaram algo, mas sem o mesmo sucesso. Ela era única e, mesmo depois dessa queda, soube superar as dificuldades. Chegou a ganhar o apelido de “Umbabarauma”, numa referência à música do Jorge Ben Jor.

“...Pula, pula, cai, levanta

Sobe, dece, corre, chuta abra espaço

Vibra e agradece

Olha que a cidade toda ficou vazia

Nessa tarde bonita só pra te ver jogar...”

Aquela palheta escreveu história voltando aos gramados para “estufar esse filó, como se fosse um rei”, de Chico, “para aplicar uma firula exata e dar um chute a gol com precisão de flecha e folha seca”. E desapareceu.

Hoje, enquanto escrevo esta crônica que remonta ao passado, projeto também este texto ao futuro, para imaginar como você, leitor – talvez numa manhã de domingo, com seu café – abre esta coluna para lhe acompanhar e, neste momento, pode ter também algumas memórias debaixo do tapete, incompreendidas e que retornam sem nem avisar. Como bem disse Tostão, o que recordamos nem sempre é um retrato exato dos fatos. Então, é nesse vão que cabe toda a ficção que nos permite ser jogador, técnico, narrador, torcida, tudo ao mesmo tempo. E é nessa conexão que lembro de Umbabarauma, minha palheta, que sobreviveu alguns anos também remendada, já que mesmo lesionada naquele pisão, marcava gol como ninguém. Talvez ela nem tivesse esse nome mesmo na época... Ou talvez nem jogasse tanto assim. Mas no catado da minha memória, aquele time jogava por música, sim! E aquela palheta era o retrato fiel do ponta de lança africano que tanto cantou Jorge Ben Jor. Minha “Umbabarauma, ‘palheta-gol’”!


E a sua palheta, tem nome? Seu time também joga por música?

Giovanni Nobile é jornalista e fundador do Águia Branca Futebol de Mesa (time que nasceu nas quadras de futsal em Santo Antônio da Platina, no Paraná, fez um jogo em 1997, ganhou, e se orgulha de ser o time há mais tempo invicto no mundo - tudo bem que nunca mais jogou, mas essa é outra história). Seu melhor resultado nas mesas foi um vice-campeonato de etapa na série extra da Liga União, cuja medalhinha tem guardada até hoje. Há mais de 10 anos, vive em Brasília. Por aqui, traz crônicas aos domingos sobre o nosso Mundo Botonista.

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nobile@mundobotonista.com.br

(061) 98105-0356

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