Se você pensa que o VAR foi criado recentemente, ledo engano, pequeno gafanhoto! Ele teve origem lá pelo final dos anos 80, pelo meu tio, irmão de minha mãe. Pena que eu não consigo provar com documento algum, mas tenho uma historinha para contar.
Era uma tarde chuvosa e a gente jogava um torneio entre quatro amigos no bom e velho assoalho da casa de minha mãe (tenho muita coisa para registrar sobre esse assoalho, ainda). Era um quadrangular de turno e returno, onde primeiro e segundo colocados fariam a grande final em jogo único, sendo que o primeiro classificado poderia jogar a decisão pelo empate.
Pobre do chão... Minha mãe o deixou brilhando, lustrado ao extremo, mas a gente detonou, tipo gramado pesado em dia de chuva no futebol de verdade. E entre um jogo e outra também comíamos pipoca, para piorar ainda mais a condição de jogo do nosso estádio. As pipocas, ora no chão, ora grudadas em nossos joelhos, deixavam nosso “gramado” como as canchas argentinas. Coisa linda, imagine...
Fui para a final com meu vizinho Giovani. Fiz a melhor campanha e fiquei com a vantagem do empate. Eu quase sempre ganhava dele. Fazendo uma proporção, de cada dez jogos eram nove vitórias e um empate. Sério mesmo, sem necessidade de ficar me gabando. Então considerei que o título já estaria praticamente garantido (autossuficiência nas alturas, admito).
Logo na saída de jogo ele abre o placar. A pressão me abraçou. Era diferente de jogar os amistosos de sempre, onde eu atuava tranquilo e logo virava o placar quando a “zebra” resolvia dar as caras. Mas aquele jogo foi, sei lá, esquisito.
Pressionei, amassei e nada de empatar. E, de repente, numa escapada, 2 a 0 para meu vizinho. Eu não acreditava no que estava acontecendo. Até que finalmente minha bola entrou e deixei o jogo em 2 a 1.
Jogo no apagar das luzes e o último lance a meu favor (nos dias de hoje tocaria a campainha). Mandei a palhetada e a bola ficou em cima da linha. Mas não ficou em cima da linha daquele jeito nítido e fácil de se resolver. Olhamos diversas vezes sem ter a certeza se a bola ultrapassou totalmente a linha. Aquele fio de cabelo do meu paletó, que deixaria dúvida até mesmo para Chitãozinho e Xororó, sabe?
Aí, já viu: eu achava isso, ele achava aquilo. Naquele momento chegou meu tio para entregar um queijo que minha mãe havia encomendado. Já que não chegaríamos a acordo algum, decidimos que ele daria o veredito. O que ele decidisse seria a conclusão do lance. Ao chamá-lo, ele veio prontamente, se ajoelhou, olhou umas 20 vezes e concluiu que aquele fiozinho acima citado, aquele maldito fiozinho, fazia com que a bola não tivesse entrado totalmente.
Perdi a partida e o título. Até hoje não engoli aquela derrota, mais ou menos como a Seleção de 82 sobreposta pela Itália. Mas, acredito fielmente, naquela tarde chuvosa foram dados os primeiros passos para a criação do VAR.