Painel do Mundo
Por Giovanni Nobile (10/10/2021)
Hoje, vou falar um pouco sobre como a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida. A frase é de Vinícius de Moraes, que dispensa apresentações, tanto como músico, como pela curiosidade de suas cenas como “árbitro” – com toda a licença poética para tal – de uma partida de futebol de botão entre Chico Buarque e Chico Anysio. A imagem é famosa dele entre os dois Chicos, assim como a história do próprio Chico Buarque com seu time de futebol de botão, o Politeama (por vezes grafado como Politheama em algumas versões do uniforme do time de futebol que nasceu, primeiro, nas mesas de futebol de botão). Mas essa não é uma história sobre eles. Depois da foto, abaixo, vocês entenderão onde quero chegar...
Essa imagem voltou a aparecer para mim no meio deste ano, quando eu pesquisava qualquer coisa sobre alguma bossa nova, já que nesta pandemia resolvi aprender a tocar violão. Entre uma pesquisa e outra, estava lá, Chico preparado para o chute.
Assim como o momento que existe entre o pedido “pro gol” e o chute, respirei fundo e me concentrei na imagem. Por um instante, consegui visualizar a palhetada. Só não deu pra ver o gol porque Chico, o Anysio, estava na frente, e infelizmente Jeferson Carvalho não estava lá nesse dia para nos mostrar o lance por todos os ângulos. Aliás, até o meio deste ano, eu nem conhecia a plataforma toda do Mundo Botonista. Mas esta imagem me levou de volta pra casa.
É que existem três tipos de botonistas: os que jogavam quando criança no século passado e nunca pararam, conseguindo se manter conectado com o jogo de forma ininterrupta. Os mais novinhos, que conheceram o botão depois dos anos 2000. E os que, assim como eu, jogaram em décadas antes dos anos 2000, mas por alguma razão deram uma longa pausa, orbitando em mundos paralelos, até regressar para casa, em nosso mundo botonista.
No caso, minha história com o botão tem ainda uma rápida passagem pela Liga União dos Botonistas do Norte do Paraná, onde conheci Jeferson, Victor, sr. Juquita e todos daquela turma animada. Isso foi em 2009. Eu estava buscando histórias para um freelancer no jornal da cidade. Aí fiquei sabendo sobre a turma que jogava botão oficial. A memória de toda uma vida veio na hora. A última vez que eu tinha jogado futebol de botão tinha sido em 1999. Eu morava em uma cidadezinha perto de Londrina, chamada Santo Antônio da Platina. Eu e meu amigo Hian jogávamos botão por lá. Certa vez, até encontramos num galpão da AABB (Associação Atlética do Banco do Brasil) da cidade umas mesas e umas travinhas jogadas de qualquer jeito, prontas para ir para o lixo. Peguei duas pra mim e as tenho guardadas até hoje.
No início daquele ano, recebi a notícia de meus pais de que a gente se mudaria de cidade, para Londrina. Foi então que, muito às pressas, eu e Hian resolvemos fazer o que muitos fazem ou fizeram: um campeonato brasileiro completo, com jogos disputados apenas entre nós dois. Foram apenas dois dias, mas disputando todos os jogos do campeonato de uma vez, até a final. Como eu me mudaria já no dia 22, tivemos que fazer todo o campeonato – varando madrugada – nos dias 20 e 21 de janeiro de 1999. Sabíamos que talvez aquelas seriam nossas últimas partidas, já que eu me mudaria e, depois, cresceria... e botão, oras, era coisa de criança.
Não temos registros de fotos desses jogos (e falarei mais sobre eles outras vezes por aqui). Mas tenho, até hoje, guardada uma fitinha com a gravação da nossa narração da decisão do título e de terceiro e quarto lugares da nossa competição. Corinthiano, o Hian encaixava seu nome no nome do time, na hora de assinar. Na capa da fitinha, os resultados dos jogos, com Cruzeiro, do Hian, campeão em cima do Santos. E a Platinense, time da cidade onde morávamos, em quarto. Ao fundo, a travinha que eu resgatei do lixo...
Bom... de rodeios em rodeios neste meu texto, peço perdão por me alongar. Mas volto, agora, ao momento em que conheci o pessoal do futebol de mesa, em 2009. Nessa época, por ocasião do destino, Hian tinha se mudado para Londrina também. Quando descobri, o pessoal da Liga União, a primeira coisa que fiz foi ligar pra ele. A gente tinha que ir lá conhecer.
Montamos um time, o Águia Branca Futebol de Mesa e, em 2010, chegamos a disputar etapas. Mas naquele mesmo ano, tive uma outra mudança, pelo trabalho, desta vez para Brasília. E lá fomos nós, mais uma vez, fazer o jogo da despedida. Na foto, Hian com o uniforme do Águia Branca. O placar da final, mais uma vez foi dele: 10x8.
E de digressão em digressão, convido a todos para retomarem comigo as primeiras linhas deste texto. Lembram que eu falava de Vinícius, Chico e cia? Quando vi aquela foto deles jogando botão, fui pesquisar novamente sobre futebol de mesa, que me reencontra a cada 10 anos, aproximadamente... E aí, tive a grata surpresa de conhecer o Mundo Botonista. Mandei uma mensagem para o Jeferson, consumi todos os conteúdos e cheguei até a escrever uma matéria, aqui no trabalho (falarei sobre ela em próximas oportunidades por aqui). Conheci o Luiz Carlos Oliveira, das Mesas Olliver. Descobri que, assim como Chico Buarque, ele tem um time próprio e compôs hino e tudo (calma, calma... essa história também merecerá ser contada aqui um dia. Mas hoje, não vou me alongar muito mais). E de contato em contato, de lembrança em lembrança, cá estou, de volta ao Mundo Botonista, com a honra do convite para poder escrever por aqui. E também já em contato com o pessoal da Federação Brasiliense de Futebol de Mesa, que já me recepcionou muito bem logo nos primeiros contatos. Ano que vem, volto para as mesas com meu Águia Branca.
Tá, mas e o Vinicius e a bossa nova?
Eu estava buscando os acordes de uma música, do Tom Jobim, quando cheguei naquela foto. A música era nada mais nada menos que “Chega de saudade”. Achei bem sugestivo. Um sinal musical e poético de que eu sou mesmo é do Mundo Botonista. Então, voltei. (E o Hian também, ainda lá em Londrina, mas como patrocinador da Taça Brasil 2021, pela Num Click Travel. Quando eu for pra Londrina ou ele vier pra cá, certamente jogaremos umas partidas...).
E Chega de Saudade, já que, sobre a partida de futebol de mesa, só uma coisa resta a dizer: “♫ Não quero mais esse negócio de você longe de mim ♫”.
“... Vai minha tristeza
E diz a ela que sem ela não pode ser
Diz-lhe numa prece
Que ela regresse
Por que eu não posso mais sofrer
Chega de saudade
A realidade é que sem ela não há paz
Não há beleza é só tristeza e a melancolia
Que não sai de mim
Não sai de mim, não sai...”
Giovanni Nobile é jornalista e fundador do Águia Branca Futebol de Mesa (time que nasceu nas quadras de futsal em Santo Antônio da Platina, no Paraná, fez um jogo em 1997, ganhou, e se orgulha de ser o time há mais tempo invicto no mundo - tudo bem que nunca mais jogou, mas essa é outra história). Seu melhor resultado nas mesas foi um vice-campeonato de etapa na série extra da Liga União, cuja medalhinha tem guardada até hoje. Há mais de 10 anos, vive em Brasília. Por aqui, traz crônicas aos domingos sobre o nosso Mundo Botonista.
....................................
nobile@mundobotonista.com.br
(061) 98105-0356